terça-feira, 22 de abril de 2014

Por que ainda erramos tanto na saúde?


Na segunda-feira da semana passada, dia 14 de abril de 2014, uma adolescente de 14 anos (mostrada na imagem ao lado) morreu após ter utilizado um medicamento errado. A menina teve uma crise de asma e, em vez de inalar um broncodilatador, inalou um colírio utilizado para o tratamento de glaucoma que promove nos brônquios o efeito inverso: a constrição. Como profissionais de saúde e usuários dos serviços, não podemos não nos angustiarmos diante desta notícia. Clique aqui para ler a notícia completa!!!

Já tivemos ao longo da história diversos casos de morte, como o da jovem Andriza, por erros de medicação. Alguns estudos estimam que nos Estados Unidos erros de medicação em hospitais causem mais de 7000 mortes por ano. No nosso país, ainda não temos essas estatísticas disponíveis. No entanto, fico me questionando até quando continuaremos a assistir pessoas morrerem por erros estúpidos sem debatermos o assunto com a importância que ele merece.

Nesse momento, não nos cabe pensar de quem é a culpa, mas pensar em maneiras de evitar a reincidência de erros como este. O grande problema é que, geralmente, todo o processo apresenta falhas e quando elas repercutem não somos capazes de pensarmos em como solucionar o problema, mas ficamos perdendo horas e horas colocando a culpa na outra categoria profissional.

Muitas vezes, podemos notar ilegibilidade de prescrições por médicos ou odontólogos; atendimento de prescrições sem a prestação efetiva da assistência pelo farmacêutico ou atendimento de uma receita que não foi 100 % compreendida; a administração equivocada pelo enfermeiro; a não adesão ao tratamento pelo paciente, entre outros. Mas, geralmente, uma morte como essa não é causada por um único erro de uma única pessoa, mas por um somatório de equívocos.

Acredito que a falta de comunicação entre os profissionais de saúde e a não prestação efetiva da assistência são os nossos grandes problemas. Nesse aspecto, quando falamos em farmácias e drogarias, a situação é ainda mais grave do que dentro das unidades hospitalares. O distanciamento entre os profissionais da saúde é notório e, ainda que erros sejam detectados, muitas vezes, o profissional não dá a devida atenção, não discute o caso com outro profissional e acaba atendendo indiscriminadamente prescrições, colocando, muitas vezes, a vida do paciente em risco.

Nesse contexto, cabe destacar ainda que enquanto a saúde continuar a ser vista única e exclusivamente como um mercado altamente lucrativo, milhões de Andrizas existirão. Precisamos conscientizar a sociedade de que medicamento é coisa séria! De que todos são responsáveis pela saúde! Os usuários dos serviços de saúde precisam saber que também possuem uma responsabilidade: é importante que saibam que possuem o direito de saber o que estão usando, o que estão comprando e os riscos e benefícios daquilo.

Não podemos prescrever medicamentos como quem rascunha uma redação, não podemos vender como quem vende doce e, acima de tudo, precisamos trabalhar em equipe, estarmos em harmonia e sermos capazes de orientar a sociedade quanto ao uso correto dos medicamentos.

terça-feira, 15 de abril de 2014

A beleza de uma segunda-feira na atenção básica!

Hoje, como aluna da residência multiprofissional em oncologia do Instituto Nacional de Câncer, estive presente, junto com outros estudantes das mais diversas categorias profissionais, na Clínica Municipal de Saúde Dom Hélder Câmara, em Botafogo, para uma atividade. A ideia era que falássemos um pouco sobre câncer com os agentes comunitários de saúde, mas o trabalho extrapolou todas as nossas expectativas.

Começamos com uma dinâmica sobre os mitos e verdades do câncer onde todos participaram ativamente. Depois mostramos um vídeo e começamos a parte expositiva da atividade, paramos para um café e continuamos a debater o assunto, encerrando com mais um vídeo  sobre cuidados paliativos. Em princípio achei que a proposta pudesse não dar certo, não sermos capazes de fomentar uma discussão interessante como o assunto merece. No entanto, fui surpreendida.


Os agentes interagiram de uma maneira tão agradável, como se já tivéssemos conversado antes. E dali pude constatar algumas coisas. Vi, na prática, como é importante que a alta complexidade esteja sempre interagindo com a atenção básica. O assunto câncer foi de ampla discussão e detectamos dúvidas básicas a respeito do assunto, importantes de serem sanadas. 

Os agentes comunitários estão em intenso contato com os pacientes e torná-los capazes de conversar sobre prevenção, fatores de risco e detecção precoce de câncer é fundamental na nossa luta para se diminuir a incidência da doença. Não podemos ficar fechados no hospital sem sabermos o que está acontecendo lá fora, sem investirmos na disseminação da informação. 

Termos a oportunidade de conversar com eles nos permitiu não só a transmissão de conhecimentos, mas também nos trouxe muito aprendizado. Fomos capazes de detectar falhas no sistema que nem sempre são detectáveis de dentro do hospital. Percebemos que ainda temos muito o que falar com a sociedade e outros profissionais de saúde sobre o assunto. Precisamos irradicar o medo de falar sobre o câncer!!!
Enfim, acho que a grande lição é que só com todos os níveis de complexidade do Sistema Único de Saúde em comunicação seremos capazes de propiciar uma saúde de qualidade à população, uma saúde verdadeiramente com prioridade preventiva!!! Precisamos ter essa consciência e trabalhar para que esses debates estejam constantemente acontecendo. No mais, agradeço a oportunidade e a recepção que tivemos na unidade de saúde, tanto pelos agentes quanto pela diretora da clínica que é, notadamente, uma profissional com vontade de fazer a diferença. 

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Judicialização da saúde: o que nós temos a ver com isso?

A judicialização da saúde é um assunto que devemos discutir e pensar não só como profissionais de saúde, mas também como usuários dos serviços. Primeiramente, o que vem a ser esse fenômeno? Fala-se em judicialização da saúde quando o usuário do serviço recorre à via judicial para garantir um direito em saúde como, por exemplo, obtenção de um medicamento.

Devemos saber que usar a via judicial é uma forma legal (digo legal no sentido denotativo da palavra, ou seja, garantido por lei) para fazer valer um direito que deveria ser atendido pelo poder executivo, mas que, por algum motivo, não o é. No entanto, muitas vezes, a busca pelo judiciário é feita de maneira desorganizada e irracional.

Então, temos dois tipos de judicialização: um que ajuda na estruturação do sistema e um que bagunça completamente esse sistema. No primeiro caso, podemos exemplificar com a alta demanda judicial por medicamentos HIV/AIDS que ocorreu na década de 90. Um grupo de pessoas entrou na justiça para assegurar seu direito ao tratamento. As demandas foram tantas que o governo detectou uma necessidade e criou uma das melhores políticas de fornecimento de medicamentos do país, reconhecida mundialmente como exemplo na terapia HIV/AIDS.

O grande problema surge, no entanto, quando os interesses individuais massacram necessidades coletivas. O indivíduo que, baseado nossa costituição federal ampla, sem limites, recorre à justiça na tentativa de obter qualquer coisa que julgue um direito em saúde. Junto as diversas interepretações da Constituição, temos um poder Jurídico despreparado para julgar questões de saúde tecnicamente complexas como as que chegam aos tribunais. O que acontece, muitas vezes, é que um sujeito entra na justiça por determinado medicamento influenciado pelo médico prescritor que, por sua vez, está sob influência do marketing da Indústria Farmacêtuica. Muitas vezes, ele está lutando por um medicamento sem registro no país ou até mesmo sem comprovação de segurança e efícácia. E aí surge um risco ao próprio paciente.

Ainda nesse contexto, observamos que a maioria dos pedidos são deferidos baseados apenas da prescrição médica. Poucas vezes, as questões técnicas são consideradas. Em outras palavras, fornece-se tudo o que se pede, trazendo muitas vezes, riscos maiores ao paciente do que benefícios e custos financeiros desnecessários. Além disso, em alguns casos, o demandante entra na justiça contra o ente federativo errado. Por exemplo, municípios são obrigados a arcar com custos altíssimos de tratamento que seria atribuição orçamentária da União.

Diante desse quadro que cresce exponencialmente no país, o nosso papel enquanto profissional de saúde é pensar em maneiras de assegurar os direitos dos usuários do sistema único. Devemos lutar para que os nossos gestores não deixem faltar condições para se tratar o paciente, tanto em quadros patológicos comuns quanto em doenças raras. No entanto, diante da falta de determinado recurso, devemos ser capazes de orientar corretamente o paciente para não causarmos um rombo orçamentário e, com isso, prejudicarmos milhões de outros pacientes. É uma luta difícil!!! Mas, cabe a nós pensarmos em maneiras de equilibrarmos a finitude dos recursos com as demandas infinitas e, ainda, não deixarmos os interesses por lucros massacrarem nossa luta em prol do acesso universal à saúde!!!